Mudança nos hábitos

Mesmo segmento, realidades diferentes

Com a pandemia, os brechós têm sentido os reflexos da crise econômica e da inflação

Carlos Queiroz -

A crise econômica e a inflação no país modificaram muitas coisas, entre elas as prioridades dos brasileiros na hora de comprar. Com isso, serviços como brechós têm ainda sentido os reflexos. De um lado a situação financeira, do outro a mudança no jeito de pensar da geração, que tem optado por reutilizar itens em vez de comprar novos. Aquilo que para alguém não serve mais, ao ser comercializado vira oportunidade a outra pessoa de se vestir bem - e gastando pouco.

É o que pensa Gilcléia Hipólito, 34. Ela conta que sempre gostou de brechós, mas com a pandemia passou a buscar com maior frequência os serviços. "Hoje se a gente for comprar uma peça de roupa nova, com o mesmo valor eu formo um look inteiro aqui no brechó. Com um produto de qualidade e, às vezes, até de marcas que eu nem poderia comprar. Vale muito mais a pena", comenta. A dona de casa ainda lembra que recentemente conseguiu se vestir gastando R$ 50,00. Em uma loja tradicional de roupas ela acredita que teria que desembolsar mais de R$ 200,00 para formar a mesma combinação.

Moradora do bairro Dunas, Aline Freitas, 34, está desempregada no momento e sua situação financeira não tem permitido compras, nem em brechós. "A gente até precisa, mas daí vai dar R$ 10,00 em uma roupa que tu vai ali e compra um pão, um pedaço de carne? Por enquanto não dá para comprar nada. Tá difícil, subiu tudo. Eu não sei o que vai ser da população", comenta.

Realidades diferentes

Rejane Freda, 59, possui um brechó no Centro de Pelotas há mais de oito anos. Ela conta que se de um lado a pandemia foi prejudicial, devido à necessidade de fechamento do estabelecimento, de outro provocou as pessoas a terem um novo pensamento sobre o que realmente é necessário. A empresária diz que desde a metade do ano passado sentiu um aumento no movimento, inclusive da presença masculina. "Tá crescendo muito, a nova geração vem com uma outra mentalidade em relação aos brechós. Eles se deram conta que desapegar é importante. Tem a questão da sustentabilidade também, do que não serve pra mim ser novo para outra pessoa", aponta.

O cenário já não é o mesmo no brechó onde Amanda de Souza, 41, trabalha como vendedora. Ela conta que antes da pandemia o movimento no estabelecimento, que fica localizado na avenida Um do Dunas, era melhor. "Anda meio fraco. As pessoas não estão tendo dinheiro. As mulheres que compram aqui são humildes e falam que preferem comprar comida do que comprar roupa", conta. Para tentar melhorar as vendas, Amanda recorreu até para aplicativos de mensagem, pelos quais oferece os itens.

Mesmo instalado na região central, a situação no brechó da Cleuza Zanolla, 60, não é muito diferente. Segundo ela, aos poucos os clientes estão voltando a comprar. O movimento, no entanto, ainda está abaixo do normal. "Longe do que era antes da pandemia. Não sei se as pessoas estão receosas ou preocupadas. E como é roupa e calçado, vão usando o que tem enquanto dá", diz. Somando-se ao cenário de pouca procura, Cleuza diz que aumentou a quantidade de pessoas interessadas em vender itens para serem comercializados.

Preconceito com o serviço

Apesar de ser cada vez menor, as proprietárias dos brechós contam que ainda há preconceito em relação aos itens comercializados por serem usados. "Tem gente que acha que brechó é para vender roupa de pessoas falecidas, com cheiro de guardado, mas eu não vejo assim. São peças que não servem mais para um, mas servem para outro. Essa geração que está vindo aí é desprovida deste tipo de preconceito. Dá para se vestir bem, gastando pouco", comenta Cleuza.

Outra situação citada por elas é em relação à situação financeira dos clientes. "Muita gente acha que são pessoas que não têm condições de comprar em outros estabelecimentos, mas não é verdade. Tem médicos, advogados, juízes, enfim, pessoas de todas as áreas e classes sociais que compram em brechó. Eu tenho coisas aqui de R$ 10,00 a R$ 300,00. Tem para todos os gostos", garante Rejane.

Recurso importante para o assistencialismo

Para entidades filantrópicas, os brechós também são uma alternativa para ajudar no pagamento dos custos de manutenção do serviço. É o caso da Associação de Pais e Amigos de Jovens e Adultos com Deficiência (Apajad). No local, o valor arrecadado também contribui para a vaga dos alunos bolsistas. Segundo a presidente da Associação, Silvana Hermann, neste momento não há como se desfazer da comercialização dos itens. "Seria bem complicada a situação, é uma renda que faz muita falta e teríamos que abrir mão de algumas coisas. O brechó faz parte do montante financeiro necessário para a instituição", conta.

O brechó da Apajad ocorre na sede da instituição todas as quartas-feiras, das 14h30min às 17h30min, e também um sábado por mês, das 10h às 17h30min. A Associação está localizada na rua Álvaro Chaves, 77.

Crescimento na venda de itens usados

De acordo com um levantamento do Sebrae, a comercialização de itens usados teve um crescimento de 48,58% no Brasil entre os primeiros semestres de 2020 e 2021. Na pesquisa foram utilizados os dados da Receita Federal e levados em consideração o comércio varejista de moedas e selos de coleção, livros e revistas e outros artigos, como móveis, utensílios domésticos, eletrodomésticos, roupas, calçados e material de demolição.

Segundo a instituição, foram abertas, no primeiro semestre do ano passado, 2.104 novas empresas no segmento, sendo 1.875 microempreendedores individuais (MEI) e 229 empresas de pequeno porte. No mesmo período de 2020, haviam sido criados 1.298 MEIs e 118 pequenas empresas.

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